"A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo. (Nelson Mandela) "

sábado, 31 de agosto de 2013

O bullying escolar
A educadora e autora do programa antibullying 'Educar para a Paz', Cléo Fante, responde às principais dúvidas sobre o bullying escolar para o portal NET Educação. Muito interessante a entrevista. Confiram!
Seu filho inventa inúmeras desculpas para não frequentar a escola, conta os dias para que as aulas terminem e apresenta baixo rendimento escolar. A atitude aparentemente ligada tão somente à displicência pode ocultar uma realidade grave e cada vez mais comum nas instituições de ensino: o bullying escolar.

O termo bullying (de origem inglesa) é utilizado para denominar agressões físicas ou psicológicas na relação entre pares, motivadas por um desejo consciente e deliberado de uma das partes de expor o semelhante a situações de tensão e maus tratos.

A abordagem do problema só não é mais imediata e eficaz por falta de conhecimento dos responsáveis. Perguntas como: “Como diferenciar o bullying de uma brincadeira de mau gosto?”, “Qual o papel da família, nesse caso?”, “E da escola?”, certamente já foram feitas por famílias, educadores e comunidade escolar.

Para responder a essas e outras questões sobre o bullying escolar, o NET Educação convidou a autora e educadora Cléo Fante para um bate papo. Confira a seguir.

NET Educação - O que é bullying?Bullying é uma forma de violência que ocorre na relação entre pares. Palavra de origem inglesa, sem tradução em nosso idioma, é adotada em muitos países para definir o desejo consciente e deliberado de maltratar outra pessoa e colocá-la sob tensão.

NET Educação – O bullying é sempre associado ao ambiente escolar?A maior incidência de bullying está entre os estudantes no ambiente escolar. No entanto, tais práticas são encontradas em outros ambientes, como nos asilos de idosos, nas prisões, nos condomínios, nas empresas.

NET Educação – Como reconhecer o bullying?
Para que uma ação seja caracterizada como bullying é necessário que haja repetição das agressões contra o mesmo alvo, a assimetria de poder entre as partes, a ausência de motivos que justifiquem os ataques e os danos causados, que podem ser materiais, físicos, morais, psicológicos etc.

NET Educação – Como diferenciar o bullying de uma atitude decorrente de mau comportamento, por exemplo?
No bullying as ações são repetidas contra o mesmo alvo e podem durar dias, semanas, meses e até mesmo anos. As ações são intencionais e tendem a se agravar ao longo do tempo, diferentemente de uma ação pontual ou inconsequente.

NET Educação – O bullying se caracteriza apenas entre alunos ou abrange os demais relacionamentos em uma comunidade escolar, como professores, coordenadores e demais responsáveis?
No Brasil, por convenção, denominamos bullying os atos agressivos, intencionais e repetitivos entre estudantes. No mundo dos adultos, seja na escola ou fora dela, costuma-se empregar o termo assédio moral ou mobbing. Fazemos essa distinção para melhor compreender o fenômeno e diferenciá-lo das demais formas de violência que ocorrem na escola.

NET Educação – O que o bullying acarreta ao ambiente escolar?Um ambiente de medo e insegurança, tanto para os que estudam como para os que trabalham nas escolas. O bullying é um grande entrave no processo educacional, podendo resultar em déficit de aprendizagem, desmotivação para os estudos, absentismo, evasão e reprovação escolar.

NET Educação – Há uma linha comportamental comum a quem pratica o bullying? E as vítimas, apresentam alguma característica comum?Geralmente, o autor de bullying apresenta insegurança e pouca confiança em si mesmo. Adota comportamentos negativos respaldados no apoio do grupo. Busca aceitação e popularidade na escola por meio da dominação e abusos. Infelizmente, colabora para que outros, com medo de serem submetidos ao seu domínio, façam parte de seu grupo para abusar ou buscar ‘presas’ para atacar. Podem apresentar comportamento irritadiço, envolvimento em discussão e/ou brigas, comportamento indisciplinado, manipulador, cruel. As vítimas, geralmente, apresentam passividade, submissão, dificuldade de se impor, de se defender, de denunciar, de motivar colegas que auxiliem. Normalmente, são aqueles que não oferecem resistência, os mais frágeis e vulneráveis, os que possuem baixa autoestima.

NET Educação – Quais são as consequências possíveis para os autores do bullying?
O comportamento intimidador do autor poderá se solidificar com o tempo, comprometendo as relações afetivas e sociais, além da aprendizagem de valores humanos, como a solidariedade, a empatia, a compaixão, o respeito a si mesmo e ao outro, o que afetará as diversas áreas de sua vida.  Muitos tendem à depressão, às ideias suicidas, ao envolvimento em atos delinquentesa, ao uso de drogas e à criminalidade. Muitos, quando adultos, cometem violência doméstica e assédio moral no trabalho.

NET Educação – E para as vítimas?
Tudo vai depender da gravidade da exposição aos maus tratos. Pode ocorrer que, no futuro, esses indivíduos sejam revitimizados ou reproduzam a vitimização em outros locais, como no trabalho ou na constituição familiar. Podem ainda apresentar transtornos psicológicos, como alimentares, de sono, ansiedade, depressão, insegurança, fobias, agressividade, baixa auto-estima, ou ainda dificuldade de relacionamento e idéias de vingança.

NET Educação – Qual deve ser a atitude dos responsáveis pela comunidade escolar quando reconhecem o bullying, tanto para com o autor, como para a vítima?O ideal é que a comunidade escolar conheça o fenômeno e saiba diferenciá-lo das brincadeiras habituais e dos atos de indisciplina. Quanto aos responsáveis pela escola, estes devem desenvolver estratégias preventivas antes que o bullying se instale e inviabilize o processo socioeducacional. Quando identificado, é necessário que a atuação seja firme, exigindo que o autor interrompa os ataques, sempre em conformidade com o Regimento Interno escolar. Dependendo da gravidade, tanto vítima quanto autor necessitam de atenção especializada. Portanto, os encaminhamentos podem ocorrer em diversas esferas - psicologia, pediatria, Conselho Tutelar, Delegacia de Polícia, Ministério Público -, sempre em parceria com a família.

NET Educação – De que maneira a família deve atuar quando o seu filho é o autor ou a vítima do bullying?
A família deve, primeiramente, oferecer o diálogo e a compreensão para que em ambos os casos possam encontrar soluções conjuntas. Deve-se também recorrer à escola para estabelecer parcerias e nunca estimular o revide ou ignorar o comportamento dominador.

NET Educação – As comunidades escolares estão preparadas para lidar com o bullying? Há dicas nesse sentido?Algumas escolas já desenvolvem ações ou programas antibullying. No entanto, a maioria ainda não está preparada, pois desconhece ou ignora o problema. O ideal é que as escolas ofereçam aos profissionais, pais e alunos espaços para a discussão e busca de soluções que possam prevenir tal comportamento. Sugerimos que a prevenção comece pelo conhecimento e este deve ocorrer por meio de estudos sobre o problema, por meio de capacitação profissional, formação de equipe multiprofissional para atendimento aos casos, espaços de escuta dos alunos envolvidos, serviço de denúncia e atendimento individualizado, entre outras ações.

NET Educação - Fale sobre o programa antibullying Educar para a Paz.O programa antibullying Educar para a Paz foi por mim desenvolvido e implantado, pioneiramente, na Escola Municipal Luiz Jacob, em São José do Rio Preto, entre os anos de 2002 a 2004. É composto por um conjunto de estratégias psicopedagógicas, direcionadas aos professores, alunos e pais, além de envolver a comunidade onde a escola está inserida. A implantação do programa na referida escola demonstrou ser eficaz na redução do comportamento bullying. O que antes era uma realidade de 66% de envolvidos no fenômeno, dois anos mais tarde transformou-se num resíduo de apenas 4%.



O programa Educar para a Paz tem conseguido auxiliar as escolas na redução do bullying escolar, bem como nas diversas formas de violência. Nossa intenção é disseminar a cultura de paz, por meio de ações que incentivem a solidariedade, a tolerância e o respeito às diferenças.  Incentivamos a criação de grupos de alunos e pais solidários nas escolas. O objetivo é que a atuação do grupo seja intensificada nos horários de entrada, recreio e saída, inibindo a ação dos agressores e incluindo os que têm dificuldades relacionais, além dos alunos novos.
Atualmente, o programa é referência em inúmeras escolas públicas e privadas do país e exterior. Tendo nosso acompanhamento direto, podemos citar as escolas de ensino fundamental II, da rede pública municipal de ensino de São José do Rio Preto (2008), as escolas de ensino fundamental I e II, da rede pública municipal de ensino de Cedral (2009-2010) e todas as escolas filiadas ao Sindicato dos estabelecimentos particulares de ensino do Distrito Federal, Sinepe/DF (2005-2009).
No livro Fenômeno Bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz, publicado pela Verus editora, em 2005, trazemos o programa antibullying na íntegra (p.91-153). As escolas podem se apropriar do programa e adaptá-lo de acordo com a sua realidade. 



Sugestões Bibliográficas:• Fante, Cleo. Fenômeno Bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Verus Editora. Campinas. 2005
• Fante, Cleo & Pedra, José Augusto. Bullying Escolar: perguntas e respostas. Artmed. Porto Alegre. 2008.



Sobre a Autora:
CLÉO FANTE Graduada em História e Pedagogia, pós graduada em didática do ensino superior e doutoranda em Ciências da Comunicação, é autora do programa antibullying Educar para a Paz

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