Chuchu (Manuel Bandeira)
Joanita,em sua última carta escrita de Haia: "Mas que saudades de chuchu com molho branco".
Eu sei que toda gente despreza o chuchu, a coisa mais bestinha
que Deus pôs no mundo, “Cucurbitácea” reles que medra em qualquer beirada de
quintal. Não tenho também nenhuma ternura especial pelo chuchu, mas já reparei
que há uma certa injustiça em considerar insípido um prato que é insípido só
porque raras são as cozinheiras que sabem prepará-lo.
Sei ainda que os médicos nutricionistas banem o chuchu de todas
as suas dietas, dizem que o chuchu não vale nada, é uma mistura de água e
celulose, desprovida de qualquer vitamina ou sal. O chuchu é meu eterno pomo da
discórdia com meu querido amigo Dr. Rui Coutinho. Quando ele desfaz do chuchu
em minha presença, salto logo em defesa do humilde caxixe. Argumento assim:
"Antigamente, antes da descoberta das vitaminas, se dizia o mesmo da
alface. Mas o sabor da planta, a boniteza de sua folha verdinha, ou talvez o
instinto secreto da espécie sempre levaram o homem a comer a aristocrá-
tica Lactuca sativa. Um dia se descobriu que a alface é rica em
vitamina A, cálcio e ferro. Então a alface deixou de ser água e celulose, e
entrou nos menus autorizados e recomendados pelos
nutricionistas.
Quem me dirá que um dia, próximo ou distante, não se descobrirá
no chuchu um elemento novo, indispensável à economia orgânica? O que me parece
inexplicável é que nós brasileiros persistamos em comer sem quase nenhum
deleite essa coisinha verde e mole que se derrete na boca sem deixar vontade de
repetir a dose.”
Rui Coutinho sorri cético.
Enquanto isso, na Holanda, Joanita, podendo comer os pratos mais
saborosos do mundo, tem saudade é de chuchu com molho branco. Que desforra para
o chuchu!
(Manuel Bandeira)
01) A passagem destacada no início do texto pode ser considerada
uma frase? Justifique sua resposta:
02) Ainda com relação à passagem que abre o texto, nela há dois
segmentos. O segundo, sozinho, pode ser considerado uma frase? Por que ele vem
isolado por aspas?
03) Exlique por que "Lactucasativa" e
"menus" aparecem destacados no texto:
04) Quanto ao gênero, como você classificaria o texto? Que fato
serviu de motivo para o autor escrevê-lo?
05) No texto, há um trecho dissertativo. Que palavra introduz a
dissertação?
06) Qual é o principal argumento utilizado na defesa do chuchu?
O que você pensa a respeito dele? Convenceu?
07) Encerrado o texto, o autor afirma: "Que desforra para o
chuchu!". Esse enunciado constitui uma frase? Justifique:
08) Qual é o significado do adjetivo "insípida" em
cada uma das frases seguintes: "O chuchu é uma comida insípida" e
"Era uma insípida noite de verão"?
09) Na linguagem coloquial, a expressão "pra chuchu"
tem sentido de abundância. Que expressão do texto comprova esse sentido dessa
expressão popular?
10) Na frase "O chuchu é meu pomo da discórdia com
meu querido amigo Dr. Rui Coutinho", qual é o sentido da expressão
destacada?
11) O autor usa vários termos para se referir ao chuchu, mas a expressão a qual ele faz referência à alface é:
(A) caxixe (B) coisinha verde. (C) coisa bestinha. (D) Cucurbitácea reles. (E) Lactuca sativa.
12) “Eu sei que toda gente despreza o chuchu, a coisa mais bestinha que Deus pôs no mundo, "Cucurbitácea" reles que medra em qualquer beirada de quintal.” No trecho anterior, as ASPAS foram usadas na expressão grifada para informar que se trata de:
(A) ironia. (B) populismo. (C) estrangeirismo. (D) termo científico. (E) ênfase na expressão.
13) Identifique a opinião do autor sobre o chuchu (transcreva):
11) O autor usa vários termos para se referir ao chuchu, mas a expressão a qual ele faz referência à alface é:
(A) caxixe (B) coisinha verde. (C) coisa bestinha. (D) Cucurbitácea reles. (E) Lactuca sativa.
12) “Eu sei que toda gente despreza o chuchu, a coisa mais bestinha que Deus pôs no mundo, "Cucurbitácea" reles que medra em qualquer beirada de quintal.” No trecho anterior, as ASPAS foram usadas na expressão grifada para informar que se trata de:
(A) ironia. (B) populismo. (C) estrangeirismo. (D) termo científico. (E) ênfase na expressão.
13) Identifique a opinião do autor sobre o chuchu (transcreva):
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segunda-feira, 10 de julho de 2017
Um homem de consciência (Monteiro Lobato)
Chamava-se João Teodoro, só. O mais pacato e modesto dos homens. Honestíssimo e lealíssimo, com um defeito apenas: não dar o mínimo valor a si próprio. Para João Teodoro, a coisa de menos importância no mundo era João Teodoro.
Nunca fora nada na vida, nem admitia a hipótese de vir a ser
alguma coisa. E por muito tempo não quis nem sequer o que todos ali queriam:
mudar-se para terra melhor.
Mas João Teodoro acompanhava com aperto do coração o
deperecimento visível de sua Itaoca.
"Isto já foi muito melhor", dizia consigo. "Já
teve três médicos bem bons -- agora um e bem ruinzote. Já teve seis advogados e
hoje maldá serviço para um rábula ordinário como o Tenório. Nem circo de
cavalinhos bate mais por aqui. A gente que presta se muda. Fica o restolho.
Decididamente, a minha Itaoca está se acabando..."
João Teodoro entrou a incubar a ideia de também mudar-se, mas
para isso necessitava dum fato qualquer que o convencesse de maneira absoluta
de que Itaoca não tinha mesmo conserto ou arranjo possível.
"É isso", deliberou lá por dentro. "Quando eu
verificar que tudo está perdido, que Itaoca não vale mais nada de nada, então
arrumo a TROUXA e boto-me fora daqui."
Um dia aconteceu a grande novidade: a nomeação de João Teodoro
para delegado. Nosso homem recebeu a notícia como se fosse uma porretada no
crânio. Delegado ele! Ele que não era nada, nunca fora nada, não
queria ser nada, se julgava capaz de nada...
Ser delegado numa cidadezinha daquelas é coisa seriíssima. Não
há cargo mais importante. É o homem que prende os outros, que solta, que manda
dar sovas, que cai à capital falar com o governo. Uma coisa colossal ser
delegado -- e estava ele, João Teodoro, de-le-ga-dode Itaoca!...
João Teodoro caiu em meditação profunda. Passou a noite em
claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada botou-as num burro, montou
seu cavalo magro e partiu.
-- Que é isso, João? Para onde se atira tão cedo, assim de armas
e bagagens?
-- Vou-me embora -- respondeu o retirante. -- Verifiquei que
Itaoca chegou mesmo ao fim.
-- Mas, como? Agora que você está delegado?
-- Justamente por isso. Terra em que João Teodoro chega a
delegado eu não moro. Adeus. E sumiu.
(Monteiro Lobato)
01) O que significa o "só", presente na primeira frase
do texto?
02) Que outras palavras poderiam substituir, mantendo o mesmo
sentido, honestíssimo, lealíssimo e seriíssimo,
respectivamente?
03) Quantas vezes aparece, no texto, o nome "João
Teodoro"? O que isso significa?
04) Reescreva a passagem destacada no primeiro parágrafo do
texto, a fim de evitar repetições do nome próprio:
05) O que diferenciava o protagonista das outras pessoas?
06) Copie do texto dois numerais, classificando-os:
07) Qual o tipo de narrador presente no texto lido? Comprove com
uma passagem dele:
08) O que as aspas sinalizam no texto em questão?
09) Transcreva do texto três substantivos próprios:
10) O que a palavra sublinhada no texto significa? Elabore uma
frase em que ela apareça com um outro significado (dizendo qual):
11) Qual a intenção de se repetir o vocábulo NADA no trecho
destacado no sétimo parágrafo?
12) Explique o valor semântico do diminutivo em "ser
delegado numa cidadezinha daquelas...":
13) Por que a palavra DELEGADO apareceu escrita da forma
"de-le-ga-do", no texto?
14) Na passagem "Pela madrugada botou-as num
burro", situada no final do texto, a palavra destacada substitui que
outra?
15) Circule no texto um exemplo de vocativo, explicando seu
raciocínio:
16) Como é caracterizada a cidade de Itaoca no texto?
17) O que significa, no contexto do conto, ser "um homem de
consciência"?
18) Que outro título você daria ao texto?
19) Que mensagem ele lhe transmitiu? Comente:
20) Ilustre a passagem do conto de que você mais gostou:
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quinta-feira, 27 de outubro de 2016
"Você é um número" (Clarice Lispector)
Você é um número
Se você não tomar cuidado vira número até para si mesmo. Porque
a partir do instante em que você nasce classificam-no com um número. Sua
identidade no Félix Pacheco é um número. O registro civil é um número. Seu
título de eleitor é um número. Profissionalmente falando você também é. Para
ser motorista tem carteira com número, e chapa de carro. No Imposto de Renda, o
contribuinte é identificado com um número. Seu prédio, seu telefone, seu número
de apartamento -- tudo é número.
Se é dos que abrem crediário, para eles você é um número. Se tem
propriedade, também. Se é sócio de um clube tem um número. Se é imortal da
Academia Brasileira de Letras tem o número da cadeira.
É por isso que vou tomar aulas particulares de Matemática.
Preciso saver coisas. Ou aulas de Física. Não estou brincando: vou mesmo tomar
aulas de Matemática, preciso saber alguma coisa sobre cálculo integral.
Se você é comerciante, seu alvará de localização o classifica
também.
Se é contribuinte de qualquer obra de beneficência também é
solicitado por um número. Se faz viagem de passeio ou de turismo ou de negócio
também recebe um número. Para tomar um avião, dão-lhe um número. Se possui
ações também recebe um, como acionista de uma companhia. É claro que você é um
número de recenseamento. Se é católico recebe número de batismo. No registro
civil ou religioso você é numerado. Se possui personalidade jurídica tem. E
quando morre, no jazigo, tem um número. E a certidão de óbito também.
Nós não somos ninguém? Protesto. Aliás, é inútil o protesto. E
vai ver meu protesto também é número.
Uma amiga minha contou que no Alto Sertão de Pernambuco uma
mulher estava com o filho doente, desidratado, foi ao Posto de Saúde. E recebeu
a ficha número 10. Mas dentro do horário previsto pelo médico a criança não
pôde ser atendida porque só atenderam até o número 9. A criança morreu por
causa de um número. Nós somos culpados.
Se há uma guerra, você é classificado por um número. Numa
pulseira com placa metálica, se não me engano. Ou numa corrente de pescoço,
metálica.
Nós vamos lutar contra isso. Cada um é um, sem número. O
si-mesmo é apenas o si-mesmo.
E Deus não é número.
Vamos ser gente, por favor. Nossa sociedade está nos deixando
secos como um número sexo, como um osso branco seco exposto ao sol. Meu número
íntimo é 9. Só. 8. Só. 7. Só. Sem somá-los nem transformá-los em novecentos e
oitenta e sete. Estou me classificando como um número? Não, a intimidade não
deixa. Veja, tentei várias vezes na vida não ter número e não escapei. O que
faz com que precisemos de muito carinho, de nome próprio, de genuidade. Vamos
amar que amor não tem número. Ou tem?
(Clarice Lispector)
01) Podemos afirmar que o texto acima é uma crônica? Justifique
sua resposta:
02) Qual o assunto do texto abordado?
03) A autora já começa com uma advertência. Qual?
04) Qual a importância dessa advertência para o texto de um modo
geral?
05) O texto todo gira em torno de uma enorme crítica ao ser
humano em sociedade, mas em um dos parágrafos há uma crítica bem mais
acentuada. Qual é esta crítica e a quem é dirigida? Você concorda? Por
quê?
06) Na sua opinião sincera, o protesto da autora é inútil?
Justifique sua resposta:
07) Há diferença entre ser tratado pelo nome ou por um número?
Explique seu ponto de vista:
08) Durante toda a exposição de seus pensamentos acerca dos
números que rodeiam nossa vida, a autora confirma a todo instante que tudo é
numerado. Apenas o que escapa de ser numerado, segundo ela? Ela tem certeza
disso?
09) Que mensagem o texto lhe transmitiu? Comente:
10) O texto encerra-se com uma indagação. Reflita e tente
escrever um pequeno texto, posicionando-se a respeito dessa questão.
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segunda-feira, 26 de setembro de 2016
Saudades do Ensino Fundamental...
Já perdi a conta de quantos anos não trabalho mais com o
Fundamental! Confesso que às vezes sinto falta! A garotada era inquieta,
elétrica, mas como a energia era boa! Aí hoje fiz uma atividade bem simples,
voltada para esse segmento, para quem ainda com ele trabalha! Espero que seja
útil!
Conversa fiada
Era uma vez um homem muito
velho que, por não ter muito o que fazer, ficava pescandonum
lago. Era uma vez um menino muito novo
que também não tinha muito o que fazer e ficava pescando no mesmo lago.
Um dia, os dois se
encontraram, lado a lado na pescaria, e no
mesmo momento, exatamente no mesmo instante, sentiram aquela puxadinha que
indica que o peixe mordeu a isca.
O menino puxou com força e precisão.
O velho usou mais precisão
e menos força. Quando apareceram
os respectivos peixes, porém, que decepção: o peixe domenino era muito
velho e o peixe do velho era muito novo! O velho disse para o
menino:
-- Você não pode pescar esse peixe tão velho!
Deixe que ele viva o pouco de vida que lheresta.
O menino respondeu:
-- E o que você vai fazer com este peixe
tão novo? Ele é tão pequeno... deixe que ele viva mais um
pouco!
O velho e o menino olharam um para o outro e, sem perder tempo, jogaram os
peixes no lago. Ficaram amigos e agora, quando não têm muito
o que fazer, vão até o lago, cumprimentam os
peixes e matam o tempo jogando conversa fora.
(Diléa Frate)
01) As personagens foram apresentadas logo no primeiro
parágrafo. O que eles tinham em comum? O que tinham de diferente?
02) Ao sentir o peixe morder a isca, por que o menino puxou com
força e precisão e o velho usou mais precisão e menos força?
03) Por que o velho pediu mais vida para o peixe velho? E por
que o menino pediu mais vida para o peixe novo?
04) Para você, quem tem mais direito à vida: os novos ou os
velhos? Explique seu ponto de vista:
05) Na sua opinião, quem pesca contribui com o extermínio dos
peixes? Justifique sua resposta:
06) Sobre o que você acha que os dois tanto conversavam?
Comente:
07) Por que o texto traz dois "era uma vez"? Qual o
objetivo da autora ao recorrer a isso?
08) Que mensagem o texto lhe transmitiu?
09) Diga a que classe gramatical cada palavra destacada
pertence:
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terça-feira, 30 de agosto de 2016
Trabalhando com a INTERTEXTUALIDADE
Texto 01: Os primeiros milagres de Eliseu
Os cidadãos disseram a Eliseu: "A posição desta cidade é
boa, como meu senhor vê, mas as águas são ruins e esterilizam o país."
Disse el: "Trazei-me uma tigela nova e ponde sal nela". Trouxeram-na;
e ele foi à fonte da água, e atirou lá o sal, dizendo: "Assim diz o
Senhor: -- Eu saneio estas águas; doravante não produzirão mais nem monte nem
esterilidade". E as águas ficaram sadias até ao dia de hoje, conforme a
palavra que Eliseu tinha proferido.
Dali subiu a Betel; e quando subia pelo caminho, uns rapazinhos
que tinham saído da cidade começaram a zobar dele, dizendo: "Sobe, ó
calvo! Sobe, ó calvo!". Ele, voltando-se para trás, olhou-os e
amaldiçoou-os em nome do Senhor. Então, saíram da floresta duas ursas e
dilaceraram quarenta e dois daqueles rapazinhos. Dali foi para o monte Carmelo,
donde voltou para a Samaria.
(2 Reis, 2, 19)
Texto 02: Eliseu
Apenas Elias foi arrebatado pelo redemoinho à sua vista. Eliseu
ficou cheio de seu espírito; fez muitos milagres, em dupla medida, e prodígio
era tudo o que da boca lhe saía. Durante a vida não tremeu diante de ninhguém,
nem mortal algum teve poder sobre seu espírito.
(Eclesiástico, 48, 12)
Texto 03: As ursas
O profeta Eliseu está a caminho de Betel. O dia é quente.
Insetos zumbem, no mato. O profeta marcha em passo acelerado.
Tem missão importante em Betel.
De repente, muitos rapazinhos correm-lhe no encalço, gritando:
-- Sobe, calvo! Sobe, calvo!
Volta-se Eliseu e amaldiçoa-os em nome do Senhor; pouco depois,
saem do mato duas grandes ursas e devoram quarenta e dois eninos: doze a menor,
trinta a maior.
A ursa menor tem digestão ativa; os meninos que caem em seu
estômago são atacados por fortes ácidos, solubilizados, reduzidos a partículas
menores. Somem-se.
O mesmo não acontece aos trinta meninos restantes. Descendo pelo
esôfago da grande ursa, caem no enorme estômago. Ali ficam. A princípio,
transidos de medo, abraçados uns aos outros, mal conseguem respirar; depois, os
menores começam a chorar e a se lamentar, e seus gritos ecoam lugubremente no
amplo recinto. "Ai de nós! Ai de nós!"
Finalmente, o mais velho acende uma luz e eles se veem num lugar
semelhante a uma caverna, de cujas paredes anfractuosas escorrem gotas de um
suco viscoso. O chão está juncado de resíduos semi-apodrecidos de antigas
presas: crânios de bebês, pernas de menins. "Ai de nós" -- gemem. --
"Vamos morrer!"
Passa o tempo e, como não morrem, se animam. Conversam, riem:
fazem brincadeiras, pulam, correm, jogam-se detritos e restos de alimentos.
Quando cansam, sentam e falam sério. Organizam-se, traçam
planos.
O tempo passa. Crescem, mas não muito; o espaço confinado não
permite. Tornam-se curiosa raça de anões, de membros curtos e grandes cabeças,
onde brilham olhos semelhantes a faróis, sempre a perscrutar a escuridão das
entranhas. E ali fazem a sua cidadezinha, com casinhas muito bonitinhas,
pintadas de branco. A escolinha.
A prefeiturazinha. O hospitalzinho. E são felizes.
Esquecem o passado. Restam vagas lembranças. que com o tempo
adquirem contornos místicos.
Rezam: "Grandes Ursas, que estais no firmamento..."
Escolhem um sacerdote -- o Grande Profeta, homem de cabeça
raspada e olhar terrível; uma vez por ano flagela os habitantes com o Chicote
Sagrado. Fé e trabalho, exige. O povo, laborioso, corresponde. Os celeirozinhos
transbordam de comidinhas, as fabricazinhas produzem milhares de belas
coisinhas.
Passa o tempo. Surge uma nova geração. Depois de anos de
felicidade, os habitantes se inquietam: por um estranho atavismo, as crianças
nascem com longos braços e pernas, cabeça nem proporcionada e meigos olhos
castanhos. A cada parto, intranquilidade. Murmura-se: "Se eles crescerem
demais, não haverá lugar para nós". Cogita-se de planificar os nascimentos.
O Governinho pensa em consultar o Grande Profeta sobre a conveniência de
executar os bebês tão logo nsçam. Discussões infinitas se sucedem.
Passa o tempo. As crianças crescem e se tornam um bando de
poderosos rapazes. Muito maiores que os pais, ninguém os contém. Invadem os
cineminhas, as igrejinhas, os clubinhos. Não respeitam a polícia. Vagueiam
pelas estradinhas.
Um dia, o Grande Profeta está a caminho de sua mansãozinha,
quando os rapazes o avistam. Imediatamente, correm atrás dele, gritando:
-- Sobe, calvo! Sobe, calvo!
Volta-se o profeta e os amaldiçoa em nome do Senhor.
Pouco depois, surgem duas ursas e devoram os meninos: quarenta e
dois.
Doze são engolidos pela ursa menor e destruídos. Mas trinta
descem pelo esôfago da ursa maior e chegam ao estômago -- grande cavidade, onde
reina a mais negra escuridão. E ali ficam chorando e se lamentando: "Ai de
nós! Ai de nós!"
Finalmente, acendem uma luz.
(Moacyr Scliar)
01) Os dois primeiros textos foram retirados de livros da
Bíblia. O fato de um remeter a outro caracteriza um tipo de intertextualidade:
quando se lê um, automaticamente lembra-se do outro porque tratam da mesma
personagem, dos mesmos fatos protagonizados por ela.
a) Releia-os e aponte as características textuais que os
diferenciam:
b) Que recursos são utilizados em cada um para atestar os fatos
milagrosos?
c) É possível dizer que um texto "lança luz sobre o
outro", ou seja, esclarece o outro? Justifique sua resposta:
02) A partir de uma passagem bíblica, o autor cria uma história
que, na verdade, é muito semelhante a um mito de criação. É
possível encontrar muitos mitos que explicam a criação do universo ou do homem
nas religiões ou na cultura popular. Pesquise alguns e compare-os com o texto
03. Há semelhanças entre eles? Comente:
03) Apesar das características do conto, a narrativa do texto 03
é pontuada de descrições realistas das cenas, que ressaltam o aspecto
científico dos fatos. Aponte algumas passagens em que isso ocorre:
04) Note que as personagens, com exceção de Eliseu, não têm nome
nem agem individualmente, mas em grupos. Na sua opinião, qual é o significado
dessa escolha, no conto?
05) Quando a sociedade se organiza finalmente, o autor passa a
utilizar o diminutivo para denominar seus produtos. Há um duplo significado
para esse fato. Indique-os:
06) O diminutivo, nesses casos, indicam carinho (afetividade) ou
tamanho? Comente:
07) Explique por que a palavra destacada no texto é grafada com S e não com Z:
08) Como você interpreta a estrutura circular desse conto?
07) Explique por que a palavra destacada no texto é grafada com S e não com Z:
08) Como você interpreta a estrutura circular desse conto?
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quarta-feira, 27 de julho de 2016
"Renúncia", de Manuel Bandeira
Renúncia
Chora de manso e no íntimo...
Procura
curtir sem queixa o mal que
te crucia:
O mundo é sem piedade e até
riria
da tua inconsolável
amargura.
Só a dor enobrece e é grande
e é pura.
Aprende a amá-la que a amarás
um dia.
Então ela será tua alegria,
E será, ela só, tua
ventura...
A vida é vã como a sombra que
passa...
Sofre sereno e de alma
sobranceira,
Sem um grito sequer, tua
desgraça.
Encerra em ti tua tristeza
inteira,
e pede humildemente a Deus
que a faça
tua doce e constante
companheira...
(Manuel Bandeira)
01) Em "Procura curtir sem queixa o mal
que te crucia", qual é o significado do verbo em destaque? Empregue-o num
sentido diferente do texto:
02) Há alguma relação entre o título e a ideia central do poema?
Justifique:
03) Comprove por que o texto é um soneto:
04) Como o poeta conceitua a dor?
05) Por que é um poema de exortação?
06) Qual a função de linguagem predominante no poema? Justifique
sua resposta:
07) Nos versos "Só a dor enobrece e é grande e é
pura", que figura de linguagem foi empregada e qual seu efeito no texto?
08) Na comparação "A vida é vã como a sombra que passa...",
que imagem o autor nos transmite sobre a vida?
09) Releia os dois últimos versos do poema e identifique a
alternativa correta:
(A) O poeta crê ser preferível a tristeza à alegria.
(B) Só Deus nos dá forças para suportar a tristeza.
(C) O poeta exorta que se peça a Deus, com humildade, alívio
para os males.
(D) O poeta transmite uma mensagem de conformismo.
10) Que mensagem o texto lhe transmitiu?
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sábado, 23 de julho de 2016
Escola sem partido ou a lei da mordaça?!?
Escola sem partidos, eu
apoio!
-- Não fale
nada. Não se misture. Tome cuidado.
Era época do
AI5. O medo rondava. Pensar era perigoso. Falar o que pensava, então, saía
caro. Custava a vida. Pessoas sumiam. Umas por dias. Outras para sempre. Não
voltavam. Ou voltavam torturadas. Aos pedaços. Coração em farrapos.
Nas escolas,
a matéria era decoreba. Folhinhas e mais folhinhas de nomes e datas. Só. Sem
grandes questionamentos ou discussões. O receio se espalhava nas almas como
triste erva-daninha em jardim abandonado. Política? A prudência aconselhava:
melhor largar de mão.
De temor em
temor, a gente se encolheu. Se afastou do contexto político. Não se envolvia,
não questionava. Assim a gente chegou ao fundo do poço. Com uma coleção
vergonhosa de políticos corruptos que, impunes, fazem o que bem entendem.
As falcatruas
são tantas que daria um álbum. Aliás um álbum bem grosso e com direito a muitas
figurinhas repetidas. Inclusive várias da mesma família.
O povo virou
herança. Passa de pai para filho. Herança que ninguém cuida. Políticos se
espalham como mato. Sugam, matam, como parasitas. Dilapidaram nossas riquezas,
e o que havia de condições de vida. Da gente, só querem o voto. Depois
descartam. Até as eleições seguintes.
A gente
permitiu. Se omitiu. Omissão também é escolha. Não ter partido já é
tomar partido. A falta de escolha já é escolha.
Agora, como
reedição do AI5, surge essa proposta da “escola sem partido”. Um projeto de lei
que visa, resumidamente, murchar a capacidade de questionamento dos alunos.
Cercear a colocação crítica dos professores. Um “projeto mordaça”.
O que está
por trás desse projeto de lei? A proposta verdadeira não é a de uma escola
neutra. Não se iluda. Nada é neutro e apartidário. O real objetivo é excluir a
liberdade de ensinar. Empobrecer ainda mais a escola que temos. Um crime.
Quem elabora
um projeto desses não tem ideia do que seja Educação. Mas tem a exata ideia do
que é pressão, repressão, perseguição e ameaça. Voltamos à ditadura. E
estupramos a constituição que assegura o pluralismo de ideias e de concepções
pedagógicas.
Estamos
abrindo a temporada de caça às bruxas. As bruxas? Os professores, essas
criaturas perigosas que pensam e ensinam a pensar.
A escola que
questiona, pondera, critica, incomoda. A escola que te leva a sonhar com uma
sociedade minimamente justa, é perigosa. Final de linha para os corruptos que
precisam e contam com os votos dos incautos abobalhados. Melhor garantir que
não se saia da decoreba boba e básica, não é?
Professores
não incitam. Alunos não são seres manipuláveis. Entre numa sala de aula.
Assista o que se passa. Os alunos de hoje são super bem informados. Antenados,
têm as próprias ideias.
Ao contrário,
manipulados, alienados é o que eles querem que a gente construa. Alunos
apáticos. Que não pensem. Não participem da dinâmica social. Não se coloquem,
não enxerguem os absurdos, não reivindiquem o justo. Robôs eleitores são o
sonho dourado para candidatos manipuladores e corruptos.
Reparem os
alunos que fizeram o lindo movimento de ocupação das escolas. Eles incomodam.
Eles põem poderes em risco. Meninos não manipuláveis? Que vão às ruas? Que
ocupam suas escolas e brigam pelos seus direitos? Meninos que se envolvem em
manifestações, atos públicos e passeatas? Claro que não pode. Cortem suas asas.
São muito perigosos. Não se pode permitir esse abuso!
Por isso é
preciso calar a educação o quanto antes. Já se perguntou porque as greves de
professores duram tanto? Porque escola fechada dá lucro. O interesse é esse
mesmo. Escolas falidas. Professores sem aula. Mal remunerados. Insatisfeitos.
Fracos. Professores que não ensinem. É o que eles precisam criar.
Professores
são como a onça Juma, morta no desfile da tocha olímpica. Você finge que trata
bem. Finge que tem consideração. Sempre mantendo cuidadosamente atrás das
grades. No máximo , se andar livre, de coleira. Ao menor ataque, nem pestaneje:
tiro, porrada e bomba. Acabe com ele.
Essa é a “lei
coleira”. Vamos aceitar? Abaixar as cabeças para facilitar a colocação? Você
que está dentro da escola, me diga. Como não falar do dia-a-dia? Do contexto
histórico? Das barbaridades que acontecem? Do desrespeito ao povo?
Como não
abordar a realidade crua e pobre dos alunos, se é o que eles vivem? Como estar
ali e não levantar questionamentos? Não se preocupar em apontar saídas? Não dar
voz às revoltas?
Disputas
políticas fazem parte da escola viva. Acontecem a todo momento. No embate pelo
respeito, pela hierarquia, nos limites, nas regras de convivência. Na
compreensão de que não vivo sozinho.
Diferenças
partidárias são apenas mais uma ponta de um todo muito maior. Professores são
diferentes. Alunos são diferentes. Faz parte. É preciso que se pense:
-- A quem
serve a escola partida, rachada, sucateada que os governos têm se empenhado em
perpetuar?
-- A quem
serve o fechamento progressivo de escolas?
-- A quem
serve um ensino que não ensina? E que, mesmo não ensinando, é obrigado a
aprovar?
-- A quem vai
servir essa pretensa “escola sem partido”?
-- Quem
propõe esse projeto de lei? Quem lucra com ele?
-- Quem vai
se servir do seu desserviço?
-- A pedido
de quem ela está sendo criada? (vou dar uma cola: procure por família
Bolsonaro...)
Pensei muito.
Medi prós e contras e aqui me posiciono. Sou a favor da escola sem partido.
Isso mesmo. Ao contrário do que você imaginou, sou a favor. Estou aberta a
mudanças. Quero uma escola melhor. Diferente da que temos hoje.
Há muito
tempo que estamos partidos. Estamos partidos nos direitos de avaliar o aluno
corretamente. Partidos de medo com o portão aberto, por falta de porteiro.
Partidos, no coração, ao ver que faltou merenda e o menino, que só contava com
aquela refeição, se encolhe de fome.
Partidos em
nossa consideração como profissionais. Desrespeitados. Somos partidos à força
em nossas greves. Partidos ao meio, profundamente, quando apanhamos da polícia
no meio da rua.
Partidos e
segregados na hora de pagamentos e reajustes que surgem como regalias só para
categorias específicas. Partidos e parcelados em salários e descontos
inadequados e ilegais. Partidos e deixados de lado, como comida ruim, pelo
Ministério Público que insiste em não nos enxergar, nem ouvir nossos apelos.
Estou farta!
Quero escola inteira, sem partidos! Tenho sede é de escola inteira. Uma
escola de discursos múltiplos. De debate e criação de conhecimento. Uma escola
crítica, como críticos já são as crianças e os adolescentes.
Uma escola de
qualidade. Boa. Suculenta em conhecimento e cidadania. Plural e linda. Um
inteiro de diversidades. De diferenças. De cabeças pensantes. De cores e
brigas, discussões e acertos.
Sem pedaços e
destroços. Sem rachaduras, nem maquiagem. Inteira em teto, chão, paredes.
Inteira em almas diversas e unidas no mesmo objetivo.
Uma escola
empenhada em problematizar. Em desconstruir e refazer. Onde, cada um com suas
características, se exponha, sem medo. E todos juntos sejam ponte, laço,
futuro. Um futuro que nos redima de um passado tão triste. E de um presente tão
duro.
Escola
inteira. Formadora de cidadãos inteiros e conscientes. Capazes de modificar o
mundo. Porque o que está aí, sinceramente, não está servindo mais.
Existe uma consulta pública. Entre, vote. Dê seu voto.
Proteste, enquanto ainda é possível. Pelo jeito que as coisas andam, a gente
não sabe até quando ainda vai poder falar o que pensa.
(Mônica Raouf El Bayeh)
01) O título
parece indicar que a autora é a favor do projeto de lei "Escola sem
partidos". No decorrer do texto isso se confirma? Justifique sua resposta:
02) Como as matérias eram ensinadas no tempo da ditadura? Voltar
a isso seria um avanço ou um retrocesso, na sua opinião? Comente:
03) Por que a gente chegou ao fundo do poço, segundo a autora?
Você concorda ou não com ela?
04) Quando a autora menciona que há algumas figurinhas
repetidas, tal expressão encontra-se no sentido denotativo ou conotativo?
Explique:
05) Ao dizer que existem várias figurinhas "da mesma
família", que problema a autora denuncia? Isso é comum de acontecer? Se é
proibido, por que então nada acontece?
06) A que a autora compara os políticos? Tais comparações são,
de fato, válidas? Comente:
07) Posicione-se sobre a passagem destacada no texto,
explicando:
08) Por que tal projeto de lei também pode ser chamado de
"lei da mordaça"? Qual o REAL objetivo dele?
09) O que é uma "caça às bruxas"?
10) Por que o professor tem sempre sido alvo desse tipo de
ameaça, de castração?
11) Por que a escola, dependendo do que ela ensina, pode ser
perigosa? Perigosa para quem?
12) Além dos professores, a autora cita outros seres
"perigosos". Quem? Por quê? O que você pensa a respeito disso?
13) Por que a greve, segundo a autora, dura tanto? Você concorda
com isso? Justifique sua resposta:
14) Retire do texto um exemplo de intertexualidade,
explicando:
15) A que a autora compara os professores? Por quê?
16) Transcreva do texto uma passagem extremamente irônica,
explicando a sua escolha:
17) Quando a autora fala que é a favor da escola sem
partidos, o termo em destaque tem o mesmo sentido do usado no projeto de
lei? Explique:
18) O que a autora disse com a passagem "Eu tenho sede é de
escola inteira"?
19) Que mensagem o texto lhe transmitiu? Comente:
20) Afinal, você é contra ou a favor do projeto de lei
"Escola sem partido"? Por quê? Já votou na consulta pública indicada
pela autora?
21) Observe a imagem abaixo e as sugestões de
"propostas". Qual delas você acha mais importante do que a que está
sendo proposta? Quem mais tem destruído o nosso país? É mesmo o
"perigoso" professor?
22) O que a charge abaixo denuncia? Comente:
Marcadores: Atualidade, Escola sem partido, Interpretação de texto, Mônica Raouf El Bayeh
segunda-feira, 4 de julho de 2016
Mais um texto ma-ra-vi-lho-so!
Uma vergonha de proporções
olímpicas
Jhonata, por
um saco de pipoca. Gisele, por ter ido trabalhar. Ana Beatriz, indo buscar a
mãe no aeroporto. Isso sem falar nas mortes por falta de hospitais. Por falta
de leitos, de medicamentos. Na falta que o dinheiro evaporado não paga, nem
compra.
Nossa lista
diária de mortes é de cortar o coração. Não tem hora. Não tem cor. Idade,
classe social, nem lugar. Reze ao sair de casa. Agradeça, se voltar.
A Educação
vai muito mal. A Saúde agoniza. Segurança já não aparece há muito tempo. Até
quando?
UERJ de
portas fechadas. Hospital Pedro Ernesto também fechando as portas. Os
funcionários sem salários ou com salários atrasados. Professores em greve há
meses sem que haja real interesse do governante em negociação. Falta verba.
Como, se todo mundo continua pagando os impostos?
O dinheiro
some de onde devia estar. Evapora. Como mágica. Aposentados com salários
atrasados passam fome. Enquanto isso, cargos comissionados são criados com
salários de até vinte e cinco mil reais. Fomos todos abandonados. Largados ao
Deus dará. Sem saúde, educação, segurança, salários. Não tem dinheiro para
quem? Essa é a pergunta correta, não?
Nossa
situação por aqui já não era boa, há muito tempo. Mas, sem dúvida, piorou muito
com as somas vultuosas das obras feitas para a Olimpíada. Cidade maquiada.
Obras que caem e se desfazem dias depois de inauguradas. Para inglês ver.
Conheço
pessoas ótimas que carregaram a tocha. Pessoas que eu admiro. Fiquei feliz de
ver o brilho nos olhos, o sorriso vitorioso. Mereceram. Foi bonito. Não estou
aqui julgando as pessoas que têm participado da passagem da tocha.
Só acho que é
preciso compreender de forma mais ampla as tentativas das pessoas de apagar a
tocha. Apagar tocha é crime?
Crime é
deixar criança com frio de noite na rua. Crime é sumir com o dinheiro da saúde.
Crime é precisar do básico e não ter. Crime é ver civis e policiais morrendo
como moscas todos os dias sem que uma política adequada seja providenciada.
Crime é não
cuidar das escolas. Crime é mandar bater em professor. Crime é ter permitido
durante tantos anos que as águas da Baía de Guanabara e da Lagoa Rodrigo de
Freitas ficassem imundas. Crime é a cara de pau de quem acha que trabalhador
não merece salário digno e no dia correto.
Por trás de
cada balde e extintor que se ergue, é a nossa revolta que se ergue junto. O
povo não é burro! O famoso e antigo "Pão e Circo" não funciona
mais. Sabe por quê? Porque o pão acabou. O povo já não
consegue comprar. O Pão e Circo virou um pobre Circo. E o circo não sustenta
quem tem fome. Temos fome. De pão, sim. E de Educação, Saúde, Segurança e,
sobretudo, Justiça.
Uma Justiça
que, tristemente, não tira a venda. E uma balança que está bem tendenciosa.
Nunca para o lado dos pobres. Esses, abandonados, cada dia mais.
Somos onça
Juma. Não importa se o que acontece nos agride os ouvidos. Se não nos é
confortável. A gente que se dane. Na menor ameaça de revolta, somos recebidos a
tiro, bomba, bala de borracha, sumiço.
Nos querem de
coleiras, mordaças, para irmos mansos para onde eles quiserem nos levar. Povo
acovardado. Adestrado. Obediente. Um povo sem cultura, doente, inseguro vira
fácil massa de manobra. Esse é o que interessa.
Por isso nos
tiram escolas. Para que a gente não questione, não levante hipóteses, não
aprenda a ler de outra forma os dados que se apresentam. Professores incomodam.
Por isso nos tiram as universidades. Os hospitais, os bandejões. Por isso não
há segurança. E nunca vai haver. O que dá segurança é a escola. A
instrução. Para cada escola fechada, um presídio aberto amanhã.
Pagamos uma
fortuna por uma festa de gosto duvidoso, a começar pelo uniforme esquisito e
cafona. A lista de falhas e vergonhas só faz crescer. Brasil virou chacota nos
jornais do mundo todo. Muitos dos escolhidos para carregar a tocha são ex-BBB e
atores. Qual sentido?
Somos piada
pronta. Isso a preço de ouro. Superfaturado. Ainda querem aplausos e claque?
Para! Pode parar! Essa tocha que atocha o povo, a gente não quer, não. Queremos
apagar essa tocha de direitos para sempre e só para os mesmos.
A tocha
arruma a cidade para gringo ver. Nos abandona miseráveis num canto. Essa tocha,
dessa forma, não nos interessa. Precisamos de tocha, sim. De outro tipo. Uma
que traga luz, que ilumine os tão abandonados caminhos da retidão. Basta de
circo. O povo quer seus direitos. O retorno de seu dinheiro de impostos.
Sobretudo, respeito e dignidade.
(Mônica
Raouf El Bayerh)
01) No
primeiro parágrafo, embora deixe claro que existem muitos casos
"anônimos", a autora cita três nomes. Explique o que aconteceu com cada
um deles:
02) Ela também cita três áreas bem problemáticas no nosso país.
Quais são elas? O que você pensa a respeito disso? Concorda com ela? Citaria
mais alguma? Comente:
03) Quais os principais sintomas do caos citados por ela no
quarto parágrafo?
04) Tente responder à pergunta (retórica) feita pela autora
nesse mesmo parágrafo:
05) Você concorda com ela que as coisas pioraram por conta da
Olimpíada? E na época da Copa do Mundo, aqui sediada? Justifique sua resposta:
06) O que significa a expressão "para inglês ver"? A
que ela é relacionada no texto? Explique:
07) A autora parece ter alguma coisa contra as pessoas que
carregaram ou carregarão a tocha? Comprove sua resposta com uma passagem do
texto:
08) Recentemente vimos a notícia de que um jovem de Manaus
resolveu apagar a tocha, quando a mesma passava por lá. Foi preso. O que você
pensa a respeito disso? E qual parece ser a postura da autora com relação a
isso? Comente:
09) Justifique o emprego dos dois porquês destacados no texto, situados
no décimo primeiro parágrafo:
10) Explique o que é a famosa política de "Pão e
circo", dizendo porque, segundo a autora, ela não funciona mais:
11) Qual dos "crimes" citados pela autora que mais
chamou a sua atenção? Por quê?
12) Que crítica a autora faz, dentre outras coisas, à Justiça? O
que você pensa com relação a isso?
13) Qual o interesse dos nossos governantes? Como eles querem
que seja o povo e por quê?
14) Qual a intenção da autora ao citar a onça Juma? Você sabe o
que aconteceu com ela? O que então a metáfora utilizada pela autora quer
dizer?
15) Posicione-se sobre a afirmação que se encontra em destaque
no texto, justificando sua resposta:
16) Que crítica a autora faz a determinadas pessoas que levarão
a tocha? Por quê? Com que intenção provavelmente foram escolhidas? Quem apenas
deveria conduzir a tocha?
17) Você acha que o Brasil está virando chacota nos jornais do
mundo todo? Merecidamente ou não? Justifique sua resposta:
18) Que expectativa você tem com relação à Olimpíada em si?
Comente:
19) Por que a autora diz que a piada é a preço de ouro e superfaturado?
Explique:
20) Que mensagem o texto lhe transmitiu?
Marcadores: Atualidade, Interpretação de texto, Mônica Raouf El Bayeh, Olimpíadas 2016
domingo, 3 de julho de 2016
Muuuuuuuuuuito bom texto!
Grevistas não são safados que
não querem trabalhar
Voto é como
compra na internet. Às vezes dá certo. Às vezes não dá, aí é um caos: vem, mas
não é seu número, é muito grande, muito pequeno, a cor não é bem o que
mostrava, vem, mas não funciona. No caso do Rio de Janeiro, parece que foi bem
assim. Votamos buscando parceria. A propaganda era enganosa e o que veio mesmo
foi um senhor de engenho.
Temos
senhores de engenho. Os escravos, muitos de nós. No caso de hoje, os
professores. Os professores fazem greve e são tratados como escravos fujões.
Claro, como todo escravo atrevido, amarrados ao tronco para aprender a lição.
Vimos cenas
de embrulhar o estômago de revolta. Nossos professores apanhando nas ruas como
cão ladrão. Ninguém se revolta? Cães maltratados dão muito mais ibope no
Facebook do que professores? Não é de se estranhar?
Os feitores,
a PM, não percebem que são tão escravos quanto os professores. Também não têm
suas necessidades básicas atendidas. Uns poucos já se revoltam com as péssimas
condições de trabalho que lhe foram oferecidas na Copa.
Barão de
Montesquieu dizia: "a injustiça que se faz a um é uma ameaça que se faz a
todos". Entenderam ou querem que eu desenhe? A PM sem alimentação e sem
acomodação adequada se queixou. Não sei se chegaram a perceber o quanto são
próximos dos professores. Em termos funcionais, quase irmãos. Mas ainda não
conseguem a empatia necessária para se irmanar com grevistas.
Os escravos
tinham quilombos, os professores não querem se esconder, querem denunciar.
Porque é preciso denunciar o massacre que está sendo feito na Educação pública.
Os desmandos sem noção que eles são obrigados a obedecer.
Professores
estão sendo demitidos, considerados INAPTOS a exercer a função porque fizeram
greve. Inaptos a quê? A fingir que está tudo bem? A se calar frente à pouca importância
que os educadores têm nesse governo? Então INAPTIDÃO é a saúde de diagnosticar
a doença! Inaptidão é vida e esperança de dias melhores. Educadores não podem
ser vaquinhas de presépio. Há crianças sendo prejudicadas. Como se calar frente
a isso?
As nossas
crianças sem seus direitos mais básicos atendidos. Eles não precisam de
crianças, precisam de números camuflados. Números que mostrem só felicidade.
Povo burro, desinformado fica feliz mais facilmente. Professores só atrapalham
esse processo de desinformação.
A chibata
agora é no salário. Os contracheques dos professores vieram zerados. Numa clara
falta de ordem, justiça ou critérios. Professores que exercem a mesma função
receberam valores que oscilam de 123,00 a zero. Com base em que mesmo?
Nossa
primeira reação é pensar:
- Bem feito.
Não trabalharam. Querem receber pelo quê? Trabalho zero, salário zero.
É com esse
tipo de apoio que o senhor de engenho conta. Só que não. Os professores
grevistas nunca se negaram a trabalhar. Trabalharam nas ruas divulgando a
educação doente, sendo depenada, silenciada, aviltada. Isso é trabalho.
Professor
grevista não é um sem-vergonha que faz greve para fugir da escola prejudicando
as criancinhas. Professores estão angustiados porque são eles que estão vivendo
esse massacre dentro e fora da escola. A educação, não se enganem, dentro das
escolas também está sendo tratada a balas de borracha. Alguém tem que
denunciar.
Professor
descontado não repõe aula. Que fique claro isso! Ele não vai trabalhar pelo que
não recebeu. Você trabalharia pelo que não recebeu? Mais uma vez, os alunos
estão sendo prejudicados. Não pela greve, mas pelo governo que parece estar se
lixando para tudo isso.
Os
professores grevistas não são safados que não querem trabalhar. São pessoas que
querem trabalhar com condições adequadas de trabalho. Sem aquela máxima de
fazem de conta que me pagam e faço de conta que ensino. Não tem faz de conta. O
que tem que ter é: faz as contas.
Faz as contas
de quantas crianças estão se perdendo, faz as contas de quantos analfabetos
funcionais estão saindo da escola com diploma, faz as contas do que vocês
governantes estão roubando dessa juventude.
(Mônica Raouf
El Bayeh)
01) A que a
autora compara o voto? Que argumentos ela usa para nos convencer? Você concorda
com ela? Justifique sua resposta:
02) Quem são os senhores de engenho? E os escravos? E os
feitores? Quem é o "escravo da vez"? Por quê?
03) A que fato a autora se refere e que a deixou revoltada? Isso
foi claramente mostrado nas mídias? Por quê?
04) Quem você acha que é pior: os senhores de engenho ou os
feitores? Justifique sua resposta:
05) Posicione-se sobre a afirmação do Barão de Montesquieu, tão
bem utilizada pela autora:
06) Por que será que PM, assim como carteiros e bancários, ou
qualquer outra categoria, quando fazem greve, não sofrem tanta pressão quanto
os professores?
07) Transcreva do quinto parágrafo uma passagem em que a autora
é irônica, explicando:
08) Qual a diferença que a autora aponta entre os escravos e os
professores? O que você pensa a respeito disso?
09) Em que parágrafo a autora sinaliza que tudo anda meio
invertido hoje em dia? Comente:
10) Na visão da autora, os professores grevistas estão sendo "vaquinhas de presépio" ou não? Quem, então, estaria sendo? Por quê?
11) Quando a autora fala que "Há crianças sendo prejudicadas", quem seria o sujeito dessa ação? De quem você já ouviu tanto falar que é a culpa? Por quê?
12) Que mensagem o texto lhe transmitiu? De que lado dessa guerra você, afinal, está?
10) Na visão da autora, os professores grevistas estão sendo "vaquinhas de presépio" ou não? Quem, então, estaria sendo? Por quê?
11) Quando a autora fala que "Há crianças sendo prejudicadas", quem seria o sujeito dessa ação? De quem você já ouviu tanto falar que é a culpa? Por quê?
12) Que mensagem o texto lhe transmitiu? De que lado dessa guerra você, afinal, está?
Aproveito o momento também para AGRADECER à já tão querida
Mônica (me tornei FÃ!) por ser esse oásis em meio a taaaaaaaaaaaaaaaaaanto
deserto! Se as porradas (literais da PMerda, e não literais -- mas que doem
tanto quanto -- das mídias, de diretores, do (des)governo, de alguns pais
desinformados, de alguns alunos preocupados...) doem, esse abraço dela foi
SALVADOR, tão necessário! Obrigada, de coração.
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"Da utilidade dos animais", de Carlos Drummond
de Andrade
Da utilidade dos animais
Terceiro dia de aula. A professora é um amor. Na sala, estampas
coloridas mostram animais de todos os feitios. É preciso querer bem a eles,
diz a professora, com um sorriso que envolve toda a fauna, protegendo-a. Eles
tem direito à vida, como nós, e além disso são muito úteis. Quem não sabe que o
cachorro é o maior amigo da gente? Cachorro faz muita falta. Mas não é só ele
não. A galinha, o peixe, a vaca... Todos ajudam.
― Aquele cabeludo ali, professora, também ajuda?
― Aquele? É o iaque, um boi
da Ásia Central. Aquele serve de montaria e de burro de carga. Do pêlo se
fazem perucas bacaninhas. E a carne, dizem que é gostosa.
― Mas se serve de montaria, como é que a gente vai comer ele?
― Bem, primeiro serve para uma coisa, depois para outra. Vamos
adiante. Este é o texugo. Se vocês quiserem pintar a parede do quarto, escolham
pincel de texugo. Parece que é ótimo.
― Ele faz pincel, professora?
― Quem, o texugo? Não, só fornece o pêlo. Para pincel de barba
também, que o Arturzinho vai usar quando crescer.
Arturzinho objetou que pretende usar barbeador elétrico. Além
do mais, não gostaria de pelar o texugo, uma vez que devemos gostar dele, mas
a professora já explicava a utilidade do canguru :
― Bolsas, malas, maletas, tudo isso o couro do canguru dá pra
gente. Não falando na carne. Canguru é utilíssimo.
― Vivo, fessora?
― A vicunha, que vocês estão vendo aí, produz... produz é
maneira de dizer, ela fornece, ou por outra, com o pêlo dela nós preparamos
ponchos, mantas, cobertores, etc.
― Depois a gente come a vicunha, né fessora?
― Daniel, não é preciso comer todos os animais. Basta retirar a
lã da vicunha, que torna a crescer...
― E a gente torna a cortar? Ela não tem sossego, tadinha.
― Vejam agora como a zebra é camarada. Trabalha no circo, e seu
couro listrado serve para forro de cadeira, de almofada e para tapete. Também
se aproveita a carne, sabem?
― A carne também é listrada? - pergunta que desencadeia riso
geral.
― Não riam da Betty, ela é uma garota que quer saber direito as
coisas. Querida, eu nunca vi carne de zebra no açougue, mas posso garantir que
não é listrada. Se fosse, não deixaria de ser comestível por causa disto. Ah, o
pingüim? Este vocês já conhecem da praia do Leblon, onde costuma aparecer,
trazido pela correnteza. Pensam que só serve para brincar? Estão enganados.
Vocês devem respeitar o bichinho. O excremento - não sabem o que é? O cocô do
pingüim é um adubo maravilhoso: guano, rico em
nitrato. O óleo feito com a gordura do
pingüim. . .
― A senhora disse que a gente deve respeitar. - Claro. Mas o
óleo é bom.
― Do javali, professora, duvido que a gente lucre alguma coisa.
― Pois lucra. O pêlo dá
escovas de ótima qualidade.
― E o castor?
― Pois quando voltar a moda do chapéu para homens, o castor vai
prestar muito serviço. Aliás, já presta, com a pele usada para agasalhos. É o
que se pode chamar um bom exemplo.
― Eu, hem?
― Dos chifres do rinoceronte, Belá, você pode encomendar um vaso
raro para o living de sua casa. Do couro da girafa, Luís
Gabriel pode tirar um escudo de verdade, deixando os pêlos da cauda para Teresa
fazer um bracelete genial. A tartaruga-marinha, meu Deus, é de uma utilidade
que vocês não calculam. Comem-se os ovos e toma-se a sopa: uma de-lí-cia. O
casco serve para fabricar pentes, cigarreiras, tanta coisa... O biguá é
engraçado.
― Engraçado, como?
― Apanha peixe pra gente.
― Apanha e entrega, professora?
― Não é bem assim. Você bota um anel no pescoço dele, e o biguá
pega o peixe, mas não pode engolir. Então você tira o peixe da goela do biguá.
- Bobo que ele é.
― Não. É útil. Ai de nós se
não fossem os animais que nos ajudam de todas as maneiras. Por isso que eu
digo: devemos amar os animais, e não maltratá-los de jeito nenhum. Entendeu;
Ricardo?
― Entendi. A gente deve
amar, respeitar, pelar e comer os animais, e aproveitar bem o pêlo, o couro e
os ossos.
(Carlos
Drummond de Andrade)
01) O texto apresenta uma aula em andamento,
caracterizando uma situação bastante dinâmica. Na apresentação da fala das
personagens, predomina o discurso direto ou indireto? Por quê?
02) A utilização predominante no tipo de discurso acima
colabora para o dinamismo, para a vivacidade do texto? Por quê?
03) “É preciso querer bem a eles, diz a professora, com
um sorriso que envolve toda a fauna, protegendo-a.” Existe uma grande contradição entre esse trecho inicial e o que
se mostra no restante do texto. Explique essa contradição:
04) Alguns trechos revelam que as crianças estavam
achando incoerente a ideia de amar e respeitar os animais e, ao mesmo tempo,
retirar coisas deles, como o pêlo ou mesmo a vida. Retire do texto dois trechos
que comprovem essa afirmação:
05) Quem foi o primeiro a perceber o discurso
contraditório da professora? Comprove com uma passagem do texto:
06) Procure outras falas dos alunos que demonstram perceber a incoerência da professora:
07) Como a professora reage a esse tipo de intervenção das crianças?
08) O que mostra a conclusão a que chegou Ricardo no final da aula?
06) Procure outras falas dos alunos que demonstram perceber a incoerência da professora:
07) Como a professora reage a esse tipo de intervenção das crianças?
08) O que mostra a conclusão a que chegou Ricardo no final da aula?
09) O texto apresenta um humor que não é puro
entretenimento: ele tem uma intenção crítica. O que o texto critica?
10) De acordo com o texto, o que o homem tem em vista na
sua relação com os animais?
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