Normalmente, quando os adultos leem as fábulas ou mesmo quando tentam interpretá-las, sobressaem os aspectos “pedagógicos” que estão na origem dessas narrativas.
Quando não existiam escolas, imprensa, quando os livros eram copiados à mão e o mundo era ainda um enorme continente inexplorado, essas histórias representavam um caminho para a educação de valores, posturas de vida, costumes.
Esse é um dos motivos pelo qual as fábulas são maniqueístas e moralistas. Falam do bem e do mal, do certo e do errado, do justo e do injusto, da união e da desunião, do medo e da coragem. Tanto que não eram dirigidas às crianças, mas especialmente aos adultos – daí o tom até assustador que assumem nas versões originais.
Mas faz sentido, nos tempos de hoje, tratar as histórias de fadas como se fazia na Idade Média. Não é esse mundo cheio de certos e errados que magnetiza as crianças (e os adultos). É, sim, a sua riqueza imaginativa, a sua base de sonhos e de possibilidades que levam os humanos para muito além de seu cotidiano. Quem não queria possuir uma bota de sete léguas, ou encontrar príncipes encantados; quem não queria ter uma varinha de condão?
As histórias são catalisadores da imaginação sem fronteiras que caracteriza a infância. Este, sim, é o caminho a ser explorado em um projeto pedagógico afinado com o século XXI.
Em um mundo marcado pelo lazer passivo da televisão, pela imobilidade dos apartamentos, pelas ruas apinhadas de carros, as histórias de fadas são um passaporte livre para o mundo da criança e para todos os processos formativos típicos da idade – a formação da personalidade, a construção de regras e valores, o desenvolvimento cognitivo, motor e socioemocional.
É aqui que entra a Escola.
Nosso papel não é inventar histórias, não é instrumentalizá-las como itens do currículo, nem tornar obrigatório um prazer tão natural. Ao contrário, nosso papel é mergulhar no fundo da fantasia, junto com as crianças, construindo permanentemente paralelos com a vida de cada um.
Voltamos ao começo deste texto. As histórias têm cheiros, cores, sabores, densidades. As histórias não são apenas processos mentais de intelecção, mas uma fábrica de sentidos e experiências.
Vamos forçar um pouco a memória: quem de nós nunca quis saber o que ia dentro da cesta de Chapeuzinho Vermelho? Pois então, vamos para a cozinha preparar esses quitutes. Que tal passear na fazenda da Galinha Ruiva? Cada momento, cada detalhe ganha uma leitura especial e diferenciada. Ou melhor, a cada leitura, a história, como um prisma, ganha novas cores. Quem conta, reconta... faz de conta.
O que as crianças aprenderão? Não há limites. Cada narrativa leva a mundos diferentes, embora tenham um substrato comum. Daí a construção de mapas conceituais para cada um dos 32 contos escolhidos.
Em cada um dos projetos, serão desenvolvidas ações pedagógicas em áreas como:
– atividades de Música e Educação F ísica, vivências apresentadas nos jogos dramáticos, que levarão os alunos a criar situações imaginárias e encenações representativas;
– a exploração de todas as dimensões artísticas;
– o aprendizado e o exercício da língua oral e escrita, conforme a faixa etária;
– a compreensão de conceitos nas áreas de Ciências e Matemática, entre outras aprendizagens;
– o uso de diversos recursos. Alguns dos contos apresentados favorecerão, também, o acesso a computadores e outros recursos tecnológicos;
– o trabalho com a linguagem e a comunicação. Os alunos possivelmente irão se familiarizar com livros, filmes e situações que requerem o uso da linguagem oral e escrita;
– atividades de exploração sensorial, todo o tempo.
Vivendo as histórias, convivendo com os personagens e suas aventuras, seus sentimentos, as crianças serão convidadas para um aprendizado prazeroso e significativo.
As histórias – como as selecionadas para o projeto – trazem saberes e experiências acumuladas por várias gerações. Oferecem exemplos de modelos e papéis que, desde a infância, facilitam nossa relação com o mundo. Levam-nos a experimentar as emoções, a “treinar” posturas, a nos identificar com personagens e situações, a sonhar coisas melhores do que temos e a perceber que tudo também poderia ser pior.
Contos de fadas, histórias de bichos e fábulas são uma porta de entrada para o mundo da fantasia, e, como podem ver, também uma porta de saída para a vida real.
Por Myriam Tricate
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